sexta-feira, 14 de agosto de 2009
Poemas de Maria das Vitórias Freire (Vicktoto) e Maria Marcela Freire (Mamafrei) publicados na revista Currais Novos.
Sertão
Ser tão árido
Ser tão quente
Ser tão vermelho
Ser tão urgente
Ser tão bonito
Ser tão da gente
Ser tão vosso
Ser tão diferente
Ser tão vivo
Ser tão latente
Ser tão castigado
Ser tão clemente
Ser tão arado
Ser tão mar
Ser tão seco
Ser tão ar
Sertão verde
Ser tão eco
Ser tão ser
Ser tão Tejo
Ser tão amigo
Ser tão do ente
Ser tão benigno
Ser tão gente
Ser tão nosso
Ser tão valente
Ser tão munido
Ser tão vivente.
Ser tão sertão...
(Mamafrei)Maria Marcela Freire
Das cheias
a beleza encontrada em locais secos como aqui
advém da observação contrita de um povo sedento
à espera , quem sabe, das doces lágrimas de São Pedro...
Da observação do velho tempo,
do forever yang vento,
dos animais e da vegetação;
das nuvens grávidas de esperança;
das chuvas que escorrem bonança.
As expectativas de cheias,
cada centímetro observado e contado...
O preenchimento dos açudes
o alagamento total dos barreiros alagados
Todos eles revestidos de mato, musgo, galho
algorabeiras enfeitadas de garças
parecendo chumaços de algodão
no algodoeiro em pleno tempo de graça.
E as aves de rapina
a espreita de algum filhote indefeso
é a fatídica sentença da vida
nesse mundo tão incoeso...
E ao redor das margens dos meu Dourado
marrecas , patos selvagens
todo ser que canta , grita e assovia,
no meu mar d´agua amado.
De repente ele sangra ,
outro também será beneficiado
transbordado, desejado
Sangra, mar do meu ser tão!
Imagina...
em nenhum outro contexto
o verbo sangrar
denotaria tal benefício:
o banho da alma nordestina...
(Mamafrei)Maria Marcela Freire
Cactus
Espinhos,
membros,
braços
abertos e Louvando para o alto
sempre à espera de um abraço.
Coitadinho...só ele é quem atende ao
“mãos pro alto”,
menino!
Só ele é
quem quer
de fato
um terno
abraço
apesar
dos espinhos.
(Mamafrei)Maria Marcela Freire
Meu ser tão... em ebulição
Vês?
Meu Seridó que dá dó de vê-lo
tão semi-árido assim
mas ele apenas finge
finge estar desgastado e morto
para depois florescer
desabrochar em um lindo jardim
Vês?
A efervescência desse jardim de pedras,
a seca ao pé das cercas
cascalhos e muros de outras eras
agudos espinhos protegendo a mim
Vês?
Esse chão de minha terra
quente e acre
manto verde de quimeras
paredes e folhas de marfim...
Vês?
Quão arisco é seu dia
escorregadio à tardinha
e melancólico ao anoitecer
Escutes!
O sussurro da madrugada
o grito do amanhecer
o murmúrio de um triste ser
Vês?
O céu já não procura outra morada
as lembranças se escondem
por trás das frestas das escadas
o silêncio fala por mim e por você
Vês?
O caminho que corta essa estrada
percorre açudes e lombadas
encontra preás e carcarás
revela eternos amores
que ainda hei de conhecer
Vês?
Muitas serras e colinas
Novos Currais e Minas
pedras preciosíssimas
paisagens do eu paraíso
prontas para se expandir
Vês?
Eis meu ser tão em ebulição
meu eu em efervescência
a natureza e eu
em plena comunhão e consciência.
(Mamafrei)Maria Marcela Freire
As bolinhas azuis
Pequenas bilocas
ocas
Translúcidas
Circulares
Imersas em água.
Divertida brincadeira
eira
que pula-pula...
Só sendo criança
pra se render
ao encanto dessas bilocas
cristalinas...
(Vicktoto)Maria das Vitórias Freire
Redoma
O menino na redoma
ou na bolha de vidro:
excesso de cuidado,
de zelo ...
a mãe que enternecia
via o mundo que adormecia
(Vicktoto)Maria das Vitórias Freire
quinta-feira, 13 de agosto de 2009
Poema de José Carlos Ferreira do Nascimento, premiado no concurso "Luiz Carlos Guimarães"
O tempo (I)
Ruminante boi pastando a madrugada
pastou pasto pastou poste pastou
pontes e estradas os arames
dos cercames os roçados implantados,
lameadas lâminas de enxada.
Pastou porteiras tamboretes candeeiros
e terreiros, o vermelho dos tijolos do alpendre.
Ruminante foi pastando ainda os chapéus
os pés de milho o cantar do grilo
toda a força do arado o orgasmo
das vacas no cio o estio no pote seco.
Intratável, tragou as fogueiras bombas
sanfonas danças, as bandeiras de São João.
Papou as árvores dos retratos
roçados dos painéis o cheiro
das areias chuviscadas,
palhas secas espalhadas no curral.
Mastigou casinhas de taipa
o caminho da roça lãs
as manhãs de colheita cactos,
as espinhentas palmas aguadas por minha vó.
Ruminante boi pastou
cor de meus cabelos meus sonhos
minha saúde meu semblante sereno, menino
lembranças de minha infância
a vida dos meus avós.
(José Carlos Ferreira do Nascimento)
Ruminante boi pastando a madrugada
pastou pasto pastou poste pastou
pontes e estradas os arames
dos cercames os roçados implantados,
lameadas lâminas de enxada.
Pastou porteiras tamboretes candeeiros
e terreiros, o vermelho dos tijolos do alpendre.
Ruminante foi pastando ainda os chapéus
os pés de milho o cantar do grilo
toda a força do arado o orgasmo
das vacas no cio o estio no pote seco.
Intratável, tragou as fogueiras bombas
sanfonas danças, as bandeiras de São João.
Papou as árvores dos retratos
roçados dos painéis o cheiro
das areias chuviscadas,
palhas secas espalhadas no curral.
Mastigou casinhas de taipa
o caminho da roça lãs
as manhãs de colheita cactos,
as espinhentas palmas aguadas por minha vó.
Ruminante boi pastou
cor de meus cabelos meus sonhos
minha saúde meu semblante sereno, menino
lembranças de minha infância
a vida dos meus avós.
(José Carlos Ferreira do Nascimento)
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